07 outubro, 2005

 

51. A Câmara de Vilar Maior e os pássaros

Há uns anos, uma das nossas televisões passou um programa… julgo que sobre Mao Tsé Tung. O que retenho desse programa é que o líder do PC Chinês ordenou uma intensa e rocambolesca caça aos pássaros por prejudicarem a agricultura. Caçaram-se, consequentemente, enormíssimas quantidades de pássaros. Afinal o resultado foi funesto: é certo que a generalidade dos pássaros comiam sementes, mas os mesmos pássaros também comiam insectos prejudiciais para as culturas. Como os pássaros rarearam, os insectos multiplicaram-se à vontade e aumentaram os prejuízos na agricultura. Enfim, foi pior a emenda que o soneto, como costuma dizer-se.
Afinal fiquei agora a saber que a medida não era inédita… só sendo de presumir que o homem não tenha vindo a Portugal inspirar-se.

Lê-se na acta da sessão de 24 de Fevereiro de 1839 que a Câmara de Vilar Maior “… determinou que sendo conhecido o grave prejuízo que as aves de qual qualidade que sejam, maxime pardais, causam às searas de toda a espécie, seja obrigado todo o habitante do concelho sendo casal a apresentar até ao fim de Março próximo futuro doze cabeças de pássaros, e sendo meio casal seis, e todo o que não cumprir será multado este na quantia de trezentos réis, e aquele na quantia de seiscentos réis e as Juntas que não fizerem cumprir esta determinação e se acharem negligentes na execução desta ordem seis mil réis para as despesas municipais para o que se passarão logo as mais terminantes ordens.”






- Edifício da antiga câmara de Vilar Maior. Hoje, após recuperação do edifício, museu local.








Na sessão de 7 de Abril, porém, a Câmara reconsiderava:
“… tomando em consideração várias representações de alguns membros das Juntas de Paróquias relativas a impossibilidade que acham em dar cumprimento à circular nº 3 de Março último sobre a restricta obrigação de cada casal obrigado a apresentar nesta Câmara o número prescrito de pássaros, em aditamento ao determinado na sessão da Câmara de vinte e quatro de Fevereiro último houve esta Câmara por bem ordenar o seguinte:
Que todo o casal será restrictamente obrigado a apresentar nesta Câmara até ao fim de Maio do corrente ano o duplo de cabeças de pássaros a saber casal vinte e quatro cabeças, e meio casal doze ficando multado aquele na quantia de 12.000 réis e este na de 6.000 réis e a Junta de Paróquia que constar não cumprir exactamente esta tão útil determinação será multada na quantia de 10.000 réis.”


Na acta da citada sessão de 24 de Fevereiro também se pode ler “… determinou a ilustríssima Câmara que sendo notório o grave prejuízo que vários bandos de lobos (animais nocivos) causam em os povos do concelho danificando toda a qualidade de vivo doméstico a ponto de entrarem nas povoações e que enquanto se não tomarem enérgicas providências seja repartida pelos povos do concelho uma porção de noz vómica para ser posta em pontos que se conheçam mais frequentes a estes animais…” Tratava-se de distribuir veneno para eliminar os lobos.

Se fizerem alguns cálculos, imaginarão que milhares de pássaros foram mortos, se as ordens foram cumpridas. E como agora o lobo é legalmente protegido, se as nossas associações de ambientalistas souberem deste caso, ainda são capazes de retroceder ao ano de 1839 e fazer uma manifestação diante do edifico da Câmara de Vilar Maior.

Humor à parte, estas determinações, para nós curiosas, são ilustrativas de problemas que na altura preocupavam os responsáveis pelos destinos concelhios.

CHGJ

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